quinta-feira, 13 de junho de 2013

Festival de Causos de São Gabriel

Homero

"O Homero era o mais novo de seis irmãos que moravam num fundo de rincão. Guri duns vinte anos, desde cedo se acostumou a ouvir as façanhas dos irmãos mais velhos: era lorota, briga, baile, gauchada...

E o Homerinho ficava encimesmado: "Um dia, ainda vou fazer alguma cousa como esses meus irmãos!". O Homero tinha duas particularidades: a primeira era uma vontade louca de conhecer a cidade, um baile do povo, uma tasca; a segunda era que tinha um medo que se pelava todo de polícia, porque um irmão tinha sido lastimado, um outro morto e ainda outro tinha levado uns planchaços de Brigadiano.

E ele tinha, então, um medo que se pelava todo de polícia... Minto! O Homero tinha três particularidades: medo de polícia, uma vontade grande de conhecer uma tasca e uma ânsia louca de comprar um revólver... "Um dia ainda vou ter um revólver!", dizia.

Acontece que ele era changador. Quando aparecia serviço, ele pegava. Às vezes, ficava em casa de companheiro da mãe, mulher já bem velha, quando os irmãos mais velhos saíam. Um dia apareceu um comparsa de esquila. Era mês de setembro, quando logo se iniciam as tosas de ovelha.

No segundo dia, um tosador cansou, e o Homeroestava lá. O chefe da comparsa perguntou ao patrão: “Não terá alguém que pegue na tesoura? “Olha, tem o Homero. Quem sabe não dá?” Tocaram o Homero na tesoura. O homem se revelou um aço! E ficou de efetivo na comparsa.

Começou a ganhar dinheiro, o Homero. E sempre com aquele troço na cabeça: "Vou conhecer a tasca e vou comprar um revólver!".

Começou a ganhar dinheiro, ganhar dinheiro... E terminou a esquila. Ele pegou o dinheiro, encilhou o cavalo e tocou pra cidade. "É hoje! Mas conheço a tasca ou compro o revólver antes? Se eu comprar o revólver e for pra tasca, vai dar um baita bochincho!

“Vou fazer o seguinte, vou na tasca primeiro e amanhã compro o revólver!". Assim foi. Tomou um trago no bolicho e comeu salame com bolacha. O bolicheiro tinha um revólver. Homero já deixou entabolado o negócio e disse pro bolicheiro: “Cuida do meu cavalo com os arreios e da minha faca. Amanhã, bem cedo, pego o revólver. E saiu, o Homero.

Por informação do irmão, ele sabia o rumo da tasca. Dali uns 500 metros achou armado o moçorongo. Foi-se chegando, por longe, assim como quem tropeia zorrilho: devagarinho e bem por longe....

Fez a volta no salão, devagarinho... Daí há pouco veio uma moça: “Vamos dançar, Baixinho?” E ele: “É! Se for preciso, bamo... “ E saiu dançando, como quem dança de meio-luto: bem abaixadinho, pelo cantos.

Dança daqui, dança dali, sentou. Uma Brahma... Ali pela sexta Brahma o Homero era dono do salão. “É comigo mesmo, hoje!” Quando o sol levantou pegou o Homero saindo da tasca, numa baita ressaca e sem um tostão no bolso.

"E agora? O que é que eu vou fazê!". Chegou no bolicho. O bolicheiro deu um mate gordo pra ele. O Homero foi perguntando: “Quanto tu me dá pela faca?” “ Dou 50 pila, disse o bolicheiro. Era o que custava uma passagem da cidade à estação do Homero. E ainda tinha de caminhar duas léguas a pé.

“Então tá. Tu me dá 50 pela faca e eu te dou meu cavalo encilhado pelo revólver. O xiru olhou o cavalo, sabia que era bom. Viu os arreios: mais ou menos... “Tá feito o negócio!”

Homero pegou o revólver. Era o que mais queria! E o baixinho saiu meio ladeado, com aquele baita 38 na cintura. Comprou uma passagem de segunda e entrou no vagão. Logo que entrou, sentou pra direita. E assim ficou, no meio daquele mundo de gente, sozinho no banco.

Dali a pouco sai o trem. E ele com aquele revólver... - "Tomara que esse trem chegue duma vez na minha estação", pensou o Homero.

Lá na ponta do vagão abriram a porta. E ele viu, assim por cima do banco, que levantou um quepe. O índio velho que vinha diz: “Revistas!” Aí o Homero se apertou! O xiru velho chegava num banco, noutro e vinha vindo... "Ai, ai, ai... tô liquidado!", pensava o Homero.

Esse xiru, na verdade, vendia bilhetes de loteria e revistas, umas até do Exército da Salvação. E vinha: “32, 38!”

Pra hoje! E o do Homero era 38! A la pucha, chê! E ele pensava: "Tô arrebentado!". E o vivente vinha num banco, chegava noutro: “O Policial! O Detetive! Salva Tua Alma! "Tô roubado!", pensava o Homero.

Um gaúcho comprou todo o 1932 que o vendedor tinha. E o bilheteiro: “32 já foi! Agora, o 38!” “Aaaaai... agora não escapo!", pensou o coitado do Homero. O Policial! E o vendedor de bilhetes chegou bem perto do Homero e sampou, forte: “38!”

E o baixinho Homero, já não aguentando mais aquela aflição braba, soltou, já aliviado: “Tá, seu guarda! Pega essa porquera logo, que desde que eu comprei essa desgraça foi só pra me incomodá!!!” "

(Fonte: Campos, Sonia Siqueira - Coordenadora. Rodada de Causos, Porto Alegre, IGTF, 1988, p. 93. www.bombachalarga.org/ver_causo.php?id=2)o - Autor: Nei Machado. Causo enviado Por: José Itajaú Oleques Teixeira - Guará (DF) - Observações: Nei Machado, inscrito pelo Pólo Cultural de Vacaria (RS), narrou este causo intitulado “Homero”, no Concurso de Causos do I Encontro Gaúcho de Literatura Oral, realizado na cidade de São Gabriel (RS), entre os dias 8 e 10 de fevereiro de 1982, junto às comemora ções da “Semana do Carreteiro”. )

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