O futebol de São Gabriel em seus primórdios não
foi diferente da maioria das cidades gaúchas e brasileiras. O esporte era
praticado por militares e pessoas da alta sociedade local. Não havia lugar nas
principais equipes para negros. Por essa razão eles foram obrigados a criar seu
próprio clube, que era pejorativamente chamado de “Canellas Pretas”. O verdadeiro
nome do clube perdeu-se junto aos velhos exemplares de jornais da época, que
cobriam o futebol.
Jornais de 1931 davam conta da existência de um
bloco carnavalesco denominado “Canellas Pretas”, que reunia a população negra
da cidade. O presidente era Alcides P. Eleutherio. É possível que o time de
futebol e o bloco carnavalesco tivessem alguma ligação.
O lateral-esquerdo Orestes provavelmente tenha
sido o primeiro jogador negro a atuar em um dos principais clubes da cidade, o
Cruzeiro. Ele veio do “Canellas Pretas”, onde era o maior destaque.
O Guarany F.B.C. de Bagé, em 1920, já contava com
jogadores negros em sua equipe. Erroneamente, o Vasco da Gama, do Rio de
Janeiro, que escalou negros apenas em 1923, é considerado como o primeiro clube
a abrir espaços para não brancos.
Três cidades gaúchas tiveram ligas de futebol
exclusivas para negros. Em Porto Alegre, a Liga Nacional de Futebol
Portoalegrense, pejorativamente chamada de “Liga da Canella Preta”. Em Pelotas,
a Liga José do Patrocínio e em Rio Grande, a Liga Rio Branco.
A separação social entre brancos e negros era
coisa comum antigamente. Hoje isso não tem mais sentido. Em São Gabriel, ainda
existe a Sociedade XV de Novembro. A Brasil fechou as portas na década de 1990.
Em minha terra natal, Dom Pedrito, existe a Sociedade Riograndense, um clube
originalmente só para negros. Em Pelotas, existem a sociedade “Fica aí pra ir
dizendo” e o “Chove e Não Molha”. E por aí afora.
São Gabriel tem motivos de sobra para orgulhar-se
de sua convivência com a população negra. O município libertou seus escravos
muito antes da Lei Áurea, graças aos esforços da Loja Maçônica Rocha Negra Nº
1.
A Vila Maria, um dos mais simpáticos bairros de
São Gabriel, foi construída pelos patrões das famílias negras. Nos primeiros
tempos, lá só moravam negros. E não foram poucas as vezes que famílias ricas se
socorreram de uma velha senhora negra, parteira famosa que até hoje é lembrada
na comunidade.
Há tempos atrás aconteceu um fato que deu muito o
que falar em São Gabriel. Um capitão do 9º RCB resolveu fazer um pelotão só de
negros, comandado por um tenente também negro. O capitão quase foi preso
e, por ordens superiores, o pelotão foi imediatamente desfeito. (Fonte: "Livro "100 anos de futebol em São Gabriel", de autoria do operador do blog, jornalista Nilo Dias)
A Vila Maria, um dos mais simpáticos bairros da cidade, foi construída pelos patrões das famílias negras. (Foto: Prefeitura Municipal de São Gabriel)
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