sexta-feira, 24 de abril de 2015

O futebol gabrielense e as histórias do seu Haddy

*Quando já se aproximava do fim a 2ª Grande Guerra em 1945, a bordo de um Ford 1938 movido a gasogênio, chegou a São Gabriel o jovem gaúcho de Monte Belo do Sul, Haddy Vicenzo Simonetto, então com 22 anos. Seu companheiro de viagem: Osmar Caleffi.

Sua vinda deu-se em função das poucas oportunidades de trabalho existentes na região do oeste catarinense, onde seus pais foram morar na cidade de Chapecó. O futuro, diziam por lá, estava nos engenhos do Rio Grande do Sul.

Na “Terra dos Marechais”, começou promissora a trajetória do seu Haddy ligada forte e intimamente à indústria do arroz e à comunidade. Com participação no nascente futebol gabrielense do qual foi um dos pioneiros.

Um dos fatos marcantes do primeiro ano foi a seca que atingiu a Campanha e a Fronteira, tão intensa que o rio Vacacaí literalmente sumiu. Na chegada, os viajantes Haddy e Osmar, que não conheciam o caminho de acesso, fizeram tranquilamente a travessia pelo leito seco do rio para chegar à cidade.

Nascem dois “gabrielenses”

Os vigorosos laços com São Gabriel tiveram início quando, da sociedade constituída pelas firmas Anselmi-Foccaccia e Caleffi-Menegotto, surgiu o Engenho Gabrielense, do qual seu Haddy não se desligou até o encerramento das atividades da empresa.

Em 1952, já diretor do novo Engenho, seu Haddy foi convidado por Arideu Ferreira (Padaria Predileta) e “Capataz” Codevilla (Barraca do Couro) para ser presidente do Grêmio Esportivo Gabrielense (GEG).  E começou com pé-quente. Nesse mesmo ano, o Gabrielense sagrou-se campeão da cidade.

O futebol era amador e disputado pelas equipes: G.E. Gabrielense, Braban, G.E. Minuano (do Exército), Manivela F.B.C. (depois se tornaria o Cruzeiro) e Gráfico F.C.

Em 1954, o futebol gabrielense passou à condição de profissional, participando de torneios contra as cidades de Dom Pedrito, Rosário do Sul, Santa Maria, Pelotas e Bagé. O campeão de cada cidade era o representante no torneio. O G.E. Gabrielense foi campeão da Zona Centro, mas desistiu de disputar as finais em Porto Alegre.

Apoio das empresas

De onde poderia vir o apoio ao futebol que estava divertindo os gabrielenses sem muitas alternativas de lazer? Naquela época, a maioria das empresas “fortes” se dedicava ao beneficiamento de produtos primários.

Assim, os engenhos de arroz, os moinhos de trigo e a charqueada dominavam a economia gabrielense. Uma das formas de se manter as equipes era através da contratação dos jogadores por parte dessas empresas.

A Cooperativa Batovi Ltda., pela força de seu diretor Fernando Lima Machado, manteve quatro atletas como empregados e o Engenho Gabrielense, três.

Bordões e apelidos

O Gabrielense ficou conhecido como o “time do farelo”. Toda vez que entrava em campo era saudado com o bordão “Farelo!!! Farelo!!!”. No time da Charqueada, invariavelmente, tinha o “pau de virar tripa”, dedicado ao jogador comprido e magro que aparecia.

Nesse sistema, muitos jogadores contratados seguiram residindo na cidade após encerrarem suas carreiras. Exemplos: Caçarola, Rodrigues, Vitrola, Cherpa, Vulcário... O Cherpa até hoje realiza caminhadas pela cidade para manter a forma.

Esposas não podiam saber das doações

O futebol era pobre, dirigido na “raça” e mantido, quase sempre, por doações. E um desses doadores resolveu pôr em dúvida a ilibada reputação do tesoureiro Gerônimo Firpo Filho.

Indignado, Firpo prometeu que, na próxima edição de “O Imparcial”, seria publicada a nominata dos doadores com a respectiva quantia doada. Foi o que bastou. A ameaça neutralizou as desconfianças.

Além das desculpas que Firpo recebeu, ainda veio o pedido para que ele desse o caso por encerrado: para os doadores, as consequências seriam imprevisíveis quando as esposas ficassem sabendo de quanto eram os valores destinados ao time de futebol.

Juiz torcedor “roxo”

Adair Menna Barreto de Abreu, torcedor do Gabrielense “roxo”, era juiz de futebol. Ficou conhecido como o “Mário Viana” de São Gabriel.

Em determinado jogo, quando o Gabrielense fez o gol, em vez de apitar, comemorou. Por sorte, poucos se deram conta do fato inusitado.

A carreira de juiz, assim, teve que terminar. Já cansado das agruras da função, em determinado jogo bastou ser xingado novamente de “ladrão”, para que ele tomasse a atitude extrema: atirou o apito no campo dizendo que desistia. E nunca mais apitou!

Tempos atuais

Quem imagina que o seu Haddy se aposentou, se engana. Ele continua, aos 89 anos, cumprindo dois expedientes na empresa que ocupa a mesma área que foi do Engenho Gabrielense. Sabe tudo sobre a sua atividade de sempre, a agroindústria.

E o futebol gabrielense? Bem, esse sumiu assim como o rio Vacacaí em 1945! (Por Plinio Dotto e Antônio Carlos Simonetto, publicado no livro "100 anos de futebol em São Gabriel", de autoria do jornalista Nilo Dias, operador deste blog)

O senhor Haddy Simonetto, em foto dos anos 40, quando era dirigente do extinto G.E. Gabrielense. (Foto: Arquivo de Nilo Dias) 

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