terça-feira, 13 de outubro de 2015

Obras sacras

A construção mais antiga de São Gabriel talvez seja a Igreja Nossa Senhora do Bom Fim, que serviu de Sé até a construção da Matriz. Esta, no inicio, estava provida apenas de uma torre, a do lado esquerdo, não havendo ainda a do lado direito, como provam as gravuras existentes.

Na Sacristia da Igreja Matriz existem plásticas, duas das quais merecem a atenção: um  São Miguel que se distingue essencialmente de muitas outras imagens deste Arcanjo, existentes em nosso Estado. O São Miguel de Nosso Senhor do Bom Fim é um termo médio entre cacique indígena, bandeirante e couraceiro espanhol.

A coroa dourada de penas de avestruz é um empréstimo da indumentária dos índios, o justilho lembra a couraça dos bandeirantes, o cinto e os penduricalhos da espada com a borla é cópia do equipamento dos oficiais castelhanos.

Não foi possível determinar a vestimenta das pernas e dos pés. Sem igual e de significação toda especial, são os traços fisionômicos do diabo. O satanás tem a cabeleira, colarinho de pregas e bigodes como costumavam tê-los os homens do povo do século XVII – soldados, colonos, carroceiros e bandeirantes. Sabe-se que os índios das reduções gostavam de chamar os portugueses, especialmente os homens de São Paulo, de demônios.

A balança que São Miguel costumava levar nas mãos, perdeu-se. Ainda existem alguns restos visíveis de pintura que deveria ter contido ouro. A cor de fundo é verde. O nome da figura representada está gravado no pedestal, em letras visíveis.

A singularidade deste São Miguel salta claramente aos olhos, quando o comparamos com aquele outro São Miguel elegante, de estilo barroco, da Matriz de São Borja, ou mais ainda com aquele Arcanjo suspenso, hoje guardado no Seminário Central de São Leopoldo, que pode ser classificado como uma das obras artísticas mais perfeitas existentes no Rio Grande do Sul e mesmo no Brasil.

A outra peça notável de Nosso Senhor do Bom Fim é um crucifixo, cuja estilização severa e surrealismo dão logo na vista.

Cooperam para a riqueza da arte sacra, em nosso Estado, as duas estátuas de origem portuguesa colocadas sobre os altares da Igreja. Há aí um São José com o menino que foi importada no século XVIII. Trata-se de obra tecnicamente acabada e lisa, mercadoria de primeira ordem, saída de oficina de mestre. Está recoberta de gesso, ricamente desenhada a ouro, nos mesmos moldes e com a mesma técnica do célebre São Francisco de Paula, de Pelotas, mas artisticamente muito inferior a esta.

Ainda na mesma Igreja encontra-se mais um exemplar de arte sacra, tipicamente colonial brasileira. Um Cristo ajoelhado parecido a numerosas outras peças do antigo Brasil-Colônia. Como os demais, está revestido com pano natural. De resto, bem diferente daquelas seis célebres imagens de Cristo existentes na Matriz de São Francisco, em Rio Pardo.

Sem dúvida, pertencem ainda a importação feita de Portugal, ao passo que estas seis estátuas muito se distanciam das obras do grande Aleijadinho, que são a expressão de um dinamismo primitivo, mas extremamente forte, interior e árduo. Finalmente, contém a Sacristia ainda um quadro a óleo sobre tela, que precisa ser limpo.

Uma escultura extremamente interessante encontra-se na pequena Igreja São José. Trata-se de um Santo Isidoro que, pela exuberância das obras da indumentária e do manto, pelas gorgueiras e punhos, deve ser do Baixo-Reino ou da Holanda.

Revela-se interessante a existência desta imagem. Sabe-se que Santo Isidoro, padroeiro da agricultura, foi muito venerado no território das Missões. Em todos os campos sua estátua estava exposta por baixo de telheiros especiais. Este espécime serve de ilustração excelente deste uso.

Ao lado do São Miguel indígena merece lugar o Menino Jesus do senhor João Pedro Nunes. Esse Menino Jesus leva na mão uma coroa de penas (um cocar dourado). Manto ricamente guarnecido em cores rosa e verde, e o corpo infantil com boa tonalidade no colorido.

Testemunha bom gosto na distribuição adequada  das cores e deve ter servido de alto-relevo, em combinação com a arquitetura dum altar ou coluna. Deixa bem patente de como deveriam ter sido as impressões de conjunto dos interiores das Igrejas e capelas das reduções jesuíticas.

E com a opinião transcrita do conhecido viajante e historiador alemão, encerra-se o primeiro capítulo de grande interesse em nossa história, nos primórdios de sua instalação, pelo estabelecimento dos primeiros núcleos populacionais da ridente São Gabriel, do Vacacai. (Fonte: Livro "São Gabriel na História", de autoria de Aristóteles Vaz de Carvalho e Silva)

A velha Igreja do Galo (ainda com o galo no alto),  se constituia em um dos prédios mais antigos da cidade. Foi restaurado, perdendo as suas carectristicas originais. (Foto: Arquivo de Magro Borin)



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