A construção mais antiga de São Gabriel talvez seja a Igreja
Nossa Senhora do Bom Fim, que serviu de Sé até a construção da Matriz. Esta, no
inicio, estava provida apenas de uma torre, a do lado esquerdo, não havendo
ainda a do lado direito, como provam as gravuras existentes.
Na Sacristia da Igreja Matriz existem plásticas, duas das quais
merecem a atenção: um São Miguel que se
distingue essencialmente de muitas outras imagens deste Arcanjo, existentes em
nosso Estado. O São Miguel de Nosso Senhor do Bom Fim é um termo médio entre
cacique indígena, bandeirante e couraceiro espanhol.
A coroa dourada de penas de avestruz é um empréstimo da
indumentária dos índios, o justilho lembra a couraça dos bandeirantes, o cinto
e os penduricalhos da espada com a borla é cópia do equipamento dos oficiais
castelhanos.
Não foi possível determinar a vestimenta das pernas e dos pés.
Sem igual e de significação toda especial, são os traços fisionômicos do diabo.
O satanás tem a cabeleira, colarinho de pregas e bigodes como costumavam tê-los
os homens do povo do século XVII – soldados, colonos, carroceiros e
bandeirantes. Sabe-se que os índios das reduções gostavam de chamar os
portugueses, especialmente os homens de São Paulo, de demônios.
A balança que São Miguel costumava levar nas mãos,
perdeu-se. Ainda existem alguns restos visíveis de pintura que deveria ter
contido ouro. A cor de fundo é verde. O nome da figura representada está
gravado no pedestal, em letras visíveis.
A singularidade deste São Miguel salta claramente aos olhos,
quando o comparamos com aquele outro São Miguel elegante, de estilo barroco, da Matriz de São Borja, ou mais ainda com aquele Arcanjo suspenso, hoje guardado
no Seminário Central de São Leopoldo, que pode ser classificado como uma das
obras artísticas mais perfeitas existentes no Rio Grande do Sul e mesmo no
Brasil.
A outra peça notável de Nosso Senhor do Bom Fim é um
crucifixo, cuja estilização severa e surrealismo dão logo na vista.
Cooperam para a riqueza da arte sacra, em nosso Estado, as
duas estátuas de origem portuguesa colocadas sobre os altares da Igreja. Há aí
um São José com o menino que foi importada no século XVIII. Trata-se de obra tecnicamente acabada e lisa, mercadoria de
primeira ordem, saída de oficina de mestre. Está recoberta de gesso, ricamente
desenhada a ouro, nos mesmos moldes e com a mesma técnica do célebre São
Francisco de Paula, de Pelotas, mas artisticamente muito inferior a esta.
Ainda na mesma Igreja encontra-se mais um exemplar de arte
sacra, tipicamente colonial brasileira. Um Cristo ajoelhado parecido a numerosas
outras peças do antigo Brasil-Colônia. Como os demais, está revestido com pano
natural. De resto, bem diferente daquelas seis célebres imagens de Cristo
existentes na Matriz de São Francisco, em Rio Pardo.
Sem dúvida, pertencem ainda a importação feita de Portugal,
ao passo que estas seis estátuas muito se distanciam das obras do grande
Aleijadinho, que são a expressão de um dinamismo primitivo, mas extremamente
forte, interior e árduo. Finalmente, contém a Sacristia ainda um quadro a óleo
sobre tela, que precisa ser limpo.
Uma escultura extremamente interessante encontra-se na
pequena Igreja São José. Trata-se de um Santo Isidoro que, pela exuberância das
obras da indumentária e do manto, pelas gorgueiras e punhos, deve ser do
Baixo-Reino ou da Holanda.
Revela-se interessante a existência desta imagem. Sabe-se
que Santo Isidoro, padroeiro da agricultura, foi muito venerado no território
das Missões. Em todos os campos sua estátua estava exposta por baixo de telheiros
especiais. Este espécime serve de ilustração excelente deste uso.
Ao lado do São Miguel indígena merece lugar o Menino Jesus
do senhor João Pedro Nunes. Esse Menino Jesus leva na mão uma coroa de penas
(um cocar dourado). Manto ricamente guarnecido em cores rosa e verde, e o corpo
infantil com boa tonalidade no colorido.
Testemunha bom gosto na distribuição adequada das cores e deve ter servido de alto-relevo,
em combinação com a arquitetura dum altar ou coluna. Deixa bem patente de como
deveriam ter sido as impressões de conjunto dos interiores das Igrejas e capelas
das reduções jesuíticas.
E com a opinião transcrita do conhecido viajante e
historiador alemão, encerra-se o primeiro capítulo de grande interesse em nossa
história, nos primórdios de sua instalação, pelo estabelecimento dos primeiros
núcleos populacionais da ridente São Gabriel, do Vacacai. (Fonte: Livro "São Gabriel na História", de autoria de Aristóteles Vaz de Carvalho e Silva)
A velha Igreja do Galo (ainda com o galo no alto), se constituia em um dos prédios mais antigos da cidade. Foi restaurado, perdendo as suas carectristicas originais. (Foto: Arquivo de Magro Borin)
A velha Igreja do Galo (ainda com o galo no alto), se constituia em um dos prédios mais antigos da cidade. Foi restaurado, perdendo as suas carectristicas originais. (Foto: Arquivo de Magro Borin)
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