Lembro de uma ocasião em que o deslocamento foi para a localidade
de “Pavão”, na região de Catuçaba. Eu era assessor de imprensa do prefeito e
acompanhei tudo de perto.
A população do lugar teve acesso a atendimento médico e
odontológico, pode encaminhar documentação do seguro desemprego, solicitar
Carteira de Trabalho e Previdência Social e uma série de outros benefícios por
parte das secretarias municipais.
O saudoso amigo, doutor Hélio Machado, na condição de odontólogo
se fez presente. O seu gabinete foi instalado em uma casa comercial, daquelas
que vendiam de tudo, desde gêneros alimentícios até roupas e utensílios
domésticos, passando por bebidas de toda a espécie.
A cadeira para uso dos clientes foi uma daquelas antigas de palha.
O primeiro a ser atendido, sentou e não demorou um minuto para dar um tremendo
grito, chamando a atenção de todos que se encontravam no local.
O doutor Hélio perguntou porque gritava, se ainda nem havia
começado a examinar seus dentes. E o homem respondeu: “É que o senhor está
pisando no meu pé”.
A título de informação deve se dizer que o doutor Hélio calçava no
mínimo 45, o que explica a reação do pobre vivente.
Eu fui cliente do doutor Hélio por muito tempo. Tratava-se de um
profissional experiente, atencioso e altamente competente. Como político foi
sempre um homem de um lado só, idealista e convicto de suas ideias. Foi
vereador e honrou seu mandato. Deixou muita saudade.
CLIMA QUENTE
Eleição para prefeito de São Gabriel. De um lado o coronel
Mesquita, primo do prefeito da época, doutor Eglon Meyer Correia. Do outro
Balbo Teixeira. Como sempre ocorre nas eleições de São Gabriel, o clima estava
mais quente que o verão do Senegal.
Na semana da eleição eu e os saudosos amigos doutor Nolan
Scipionni e Ciro Jardim de Oliveira, viajamos até Venâncio Aires para buscar a
edição do jornal “Eco dos Pampas”, que estava a serviço da Prefeitura.
O pessoal da oposição acreditava que o jornal traria alguma
denúncia grave contra Balbo e trataram de evitar que a publicação chegasse a
cidade. E esperaram a caminhonete “Veraneio” em que viajávamos, nas
proximidades de Santa Margarida.
A partir dai verificou-se um tiroteio pela BR-290, que felizmente
não resultou em nada mais grave. Chegamos na Polícia Rodoviária e não havia
ninguém por lá. O negócio foi dobrar em direção ao Jardim Europa e entrar a
“mil” na casa do doutor Nolan.
Os perseguidores vieram logo atrás, e só não entraram na
propriedade porque o doutor Nolan reagiu com uma arma de cano serrado. Eram 4
horas da madrugada e a vizinhança todinha acordou assustada.
Como não cortaram o fio do telefone, foi possível ligar para o
doutor Eglon e para a Polícia. Em seguida a rua ficou tomada de gente. Creio
que por mais de 200 pessoas. A Brigada Militar evitou que os opositores
entrassem na propriedade.
Muitas pessoas vieram nos dar solidariedade, entre elas lembro do
amigo Bereci da Rocha Macedo. Também do prefeito Eglon e do nosso candidato
coronel Mesquita e seu vice. O doutor Eglon sentiu-se mal e teve de receber
atendimento médico.
O jornal, que não trazia nada de especial sobre o candidato Balbo
Teixeira, por via das dúvidas, foi tirado da “Veraneio” e colocado no carro do
saudoso coronel Gabriel Abbott Rodrigues, que deixou o local em alta
velocidade.
E o episódio terminou sem nenhuma vítima. Não cito nomes dos opositores
que participaram do atentado, por razões óbvias. Foi mais uma prova de que a
política em São Gabriel não é feita para amadores.
AVENTURA EM LIBRES
A história a seguir, o amigo Rômulo Farias contou em sua página no
Facebook. Aliás, ele se revelou um ótimo contador de histórias, o que enriquece
sua biografia, já bastante admirável pela passagem na Câmara Municipal, como
vereador combativo que foi.
E ele jura que o episódio a seguir realmente aconteceu. Certo dia,
seguramente mais de 30 anos atrás, ele por pouco não caminhou rumo a morte.
E salienta que tem três testemunhas do caso, o ex-vereador Adão
Cavalheiro, o ainda vereador Carlos Alberto Lannes, o “Cacaio” e o também
ex-vereador Bento Borges.
Haveria uma quarta testemunha, o saudoso Chico Mello. Naquela
época todos eles tinham porte de arma de fogo. E se deslocaram até Uruguaiana
para tomarem parte em uma reunião de cunho político.
E como ir a Uruguaiana e não dar uma esticada até Libres,
Argentina, é como ir a Roma e não tentar ver o Papa. Em Libres, quase tudo é
barato. Os cinco entraram em uma loja. Rômulo e Bento aproveitaram para comprar
balas longas, calibre 38.
Até ai, tudo bem. Rômulo conta que tinha uma pistola 380. O Adão
Cavalheiro, mais “pacifico” se limitou a comprar salames e doces para seus
filhos.
Entre uma loja e outra o tempo foi passando. Enquanto isso o
Exército Argentino entrou em prontidão. Já passava das oito da noite, e havia
revista total em quem se encontrasse nas ruas. Eram os anos de chumbo no
vizinho país.
O Bento Borges ficou apavorado e tratou logo de entrar na Van que
os levou até Libres. Enquanto isso o Rômulo tirava as balas das caixas e as
colocava dentro dos sapatos. O Bento viu tudo e tratou de pegar um sobretudo
que havia comprado há pouco, e que deve ter hoje.
E o vestiu, com a etiqueta virada para as costas. Enquanto isso os
militares armados se aproximaram do Rômulo, ordenando que andasse em direção a
barreira sanitária.
Nesse instante Rômulo olhou para trás e viu o Bento Borges, com
aqueles sapatões 44, “desbicados”, cheios de balas de revólver. Deu um pavor em
Rômulo, ao lembrar que o amigo Bento tinha unhas encravadas, “pior que um
chifre de carneiro”, segundo ele.
Estava atrás de Rômulo, sendo escoltado. Este falou para Bento:
“Não vai esfregar com força esses teus pés, que pode me matar”. Sem dúvida
poderia abrir um buraco em suas costas, caso uma unha encravada atingisse
alguma espoleta.
Rômulo pensou estar indo em direção a um pelotão de fuzilamento.
Um suor forte molhou seu corpo, enquanto soldados pegavam o salame que o Adão
Cavalheiro havia comprado.
Ele fez a maior gritaria do mundo, e lascou: “Tem gente que compra
bala de revólver, e vocês não fazem nada. E tomam um salame que comprei para
meus filhos. E sei que vocês vão comer”.
Rômulo, naquele momento chegou a achar que o Adão Cavalheiro ia
abrir o jogo e entrega-los de bandeja aos militares. Foi quando o chefe da
guarda perguntou:
“Alguém tá levando alguma coisa ilegal?” E Rômulo, para tirar o
seu da reta, respondeu: “Moço, sobretudo pode? Esse aí de trás está com a
etiqueta virada”.
Enquanto isso Rômulo olhava os pés do Bento, e rezava para tudo
que é santo, para que não resolvessem examinar os sapatos dele. O Bento se
manteve calmo, e passou deslizando aquele sapatão, que mais parecia um “Colt
45”.
Imaginem a cena. O Bento Borges atrás de Rômulo, com aqueles
sapatões tapados de balas 38. (Pesquisa: Nilo Dias - Publicado no jornal "O Fato", de Sao Gabriel-RS, edição de 14 de agosto de 2019)
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